Olá, queridos! Como vão?
Quase esqueço que tinha newsletter pra escrever, os dias têm sido todos iguais, mas não necessariamente ruins. É a rotina, que às vezes é quebrada pela presença de um gambá na árvore da frente da loja, ou por um ultracongelador que para de funcionar, alterando toda a produção da semana.
Nesta edição, só breves pensamentos, ok?
Planos
Quando 2024 efetivamente começou — ou seja, quando minha irmã e sobrinho voltaram pra casa e eu terminei de chorar — decidi que este seria o ano da criatividade e da escrita. Comprei aquele livro do Rick Rubin, entrei no Google e pesquisei “calendário literário 2024”, enviei meus textos para alguns concursos, marquei na agenda eventos que gostaria de participar. Separei meu Instagram particular do profissional e achei que postaria muitos eventos no decorrer do ano, mudei minha profissão no LinkedIn para “escritora”. Sentei por horas na frente do computador disposta a escrever e… nada. Tirando esta newsletter, que é quando me reconecto com a escrita, não tive contato algum com a esperada criatividade.
Talvez eu precise ter uma história na cabeça para escrever, ou de uma dor-de-cotovelo motivadora, não sei. Este ano, não vivi nada que me colocasse com as mãos no teclado e dissesse “vai”, como foi enquanto escrevia o livro. No máximo, reformei uns poemas do passado, que no presente nem representam o que eu sentia quando os escrevi.
Mas é sobre isso e tá tudo bem. Quem sabe ano que vem, quem sabe nunca mais, quem sabe foi só uma fase na minha inconstante vida.
Gonzo
Foi no mesmo dia que passei com Rhythm of the Night na cabeça, eu lembro bem. Fui brincar na casa da menina nova da classe, em Vargem Grande Paulista, e acabei ficando para o aniversário do pai dela, um homem de saúde bastante fragilizada. Lembro de ficar segurando um arroto com medo de sair bem alto e de ter dito pras tias velhinhas dela que eu era “brasa dormida” quando elas comentaram que eu era muito quieta. O irmão mais velho dela era bem gatinho, e depois desse dia eu descobri que ele me apelidou de Gonzo — esquisita e nariguda.
Fiquei arrasada. Com 13 anos, definindo minha personalidade adolescente, era um soco no estômago ser tachada de estranha por um garoto de 17. Era quase uma sentença de morte. Passei o resto dos anos, até a faculdade, tentando mascarar essa característica definida por ele, nem sempre com sucesso.
Curiosamente — e eu sei que vocês não aguentam mais esse assunto, mas problema de vocês, vão ter que engolir — foi quando eu tive o diagnóstico de TDAH que tudo melhorou. Se eu abracei minha esquisitice? Não, mas as coisas passaram a fazer sentido. Descobrir o jeito que sua cabeça funciona é libertador, entender o que é do neuroatípico e o que é da personalidade, também. E, no fim das contas, eu nem me acho tão esquisita assim — nem o Gonzo. Sim, eu falo demais, eu faço as coisas de um jeito torto, eu tropeço e derrubo coisas mais do que gostaria, meu dia todo é comprometido por um compromisso às cinco da tarde etc., mas é assim que as coisas são.
Hoje eu entendo e não fico mais indignada com a opinião de um rapaz de quem, olha que doido, não consigo lembrar nem o nome. E olha que eu lembro tudo desse dia.
A trilha sonora da minha cabeça
Todo dia eu levanto com a música do aplicativo do sono do meu celular. Embora ela não se pareça com nada que eu conheça, a melodia permanece um bom tempo ressoando no meu cérebro.
Aí eu vou tomar café da manhã, e o barulho do micro-ondas avisando que o leite está quente me lembra a primeira frase da primeira estrofe de Barracuda, do Heart, então essa canção toma o lugar da anterior e fica tocando na minha cabeça enquanto me arrumo.
Quando ultrapasso o portão do prédio, tenho duas opções. Saindo, ele faz o barulho do sax inicial de Blá blá blá… Eu te amo, do Lobão. Voltando do trabalho, toca o prelúdio da Suíte para Violoncelo No. 2 em Ré Menor, de Bach, na versão do Mischa Maisky. Específico.
O aviso de mensagem do celular de trabalho parece com a introdução de um axé capacitista que meu amigo Vader compôs quando estávamos na faculdade, tocado imaginariamente em xilofone. Jamais reproduzirei a letra.
Meu nome é Bia Bonduki, e eu sou escritora. Quer dizer, eu sou meio pau pra toda obra, mas em 2022 eu lancei meu primeiro livro, Até contentar o coração, e usei desta newsletter para fazer as atualizações do processo, junto com outras incursões que fazia no passado – delivery de pratos árabes, meus textos no Medium e o podcast Eu Tive Um Sonho. Agora, por aqui, falo da vida em geral, das coisas que tomam espaço na minha cabeça e me mantêm acordada por mais tempo, além de fazer recomendações de coisas que li/ouvi/assisti/conheci.
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meu Deus, como um bip de microondas pode parecer Barracuda?
mas eu te entendo completamente, pois meu som de notificação de mensagens de grupos do WhatsApp me chama imediatamente à música "the power of love" , do Huey Lewis & The News
Cabeças musicais, adoro!